sexta-feira, 5 de outubro de 2012

CONVENÇÃO DE PASTORES TAMBÉM É IGREJA

CONVENÇÃO DE PASTORES TAMBÉM É IGREJA

Pr. Claudionor de Andrade

Dias desses ouvi um pregador dizer que convenção de pastores não é igreja. Depois de uns volteios retóricos, esse tal pregoeiro fez uma pausa, e arrematou: “Para mim, convenção não passa de uma mera entidade paraeclesiástica”.

Confesso que essa declaração deixou-me bastante preocupado. Se convenção não é igreja, o que é então? Um sindicato? Um grêmio? Ou um clube? Eu sei muito bem que, juridicamente, há diferenças entre igreja e convenção. Teologicamente, contudo, a igreja faz-se presente todas as vezes que dois, ou três, congregam-se em o nome do Nazareno. E, pelo que tenho visto, numa convenção não se reúnem apenas dois ou três, mas centenas e, às vezes, milhares de obreiros. Logo, como não é igreja, se tantos pastores, evangelistas e até mesmo teólogos encontram-se congraçados em o nome do Filho de Deus?

Afinal, se convenção não é igreja, é o quê? Tomara não venha a transformar-se numa agremiação partidária, com todos os vícios (e quase nenhuma virtude) da política secular. Se isso acontecer, deixaremos de ser igreja para nos fazermos povo. No Pentecostes, o povo fez-se igreja e admirava a todos por sua santidade, comunhão e serviço. Problemas? Havia-os e não eram poucos. Entretanto, cada dificuldade era dirimida sob a orientação do Espírito Santo.

Em Atos dos Apóstolos, registra Lucas a ocorrência de três concílios. No primeiro, os discípulos concentraram-se a fim de escolher o substituto de Judas Iscariotes. Observe-se que a decisão do colégio apostólico foi precedida por uma reflexão teológica e por uma fervorosa súplica (At 1.26). O sorteio foi apenas um detalhe naquele clima de concórdia e temor a Deus. No segundo concílio, os apóstolos convocaram a comunidade dos discípulos, para resolver uma emergência social: o socorro às viúvas dos judeus helenistas (At 6.1-6).

Encerrada a reunião, ganhava a igreja o diaconato. Quanto ao terceiro concílio, o que podemos dizer? Apesar da nevralgia do tema, a reunião é concluída com uma declaração que ressalta a unidade e madureza da Igreja Apostólica: “Pois pareceu bem ao Espírito Santo e a nós não vos impor maior encargo além destas coisas essenciais: que vos abstenhais das coisas sacrificadas a ídolos, bem como do sangue, da carne de animais sufocados e das relações sexuais ilícitas; destas coisas fareis bem se vos guardardes. Saúde” (At 15.28.29).

Concílio ou Convenção?

Visando a conciliar os bispos de todas as regiões do Império Romano, o imperador Constantino (272-337) convocou-os, em 325, a uma reunião em Niceia. A cidade, localizada na atual Iznik, região hoje pertencente à Turquia, era de fácil acesso à maioria dos pastores. A esse encontro deu-se o nome de Primeiro Concílio Ecumênico da Igreja Cristã, pois todas as congregações deveriam estar ali representadas. Segundo Atanásio, 318 dignitários fizeram-se presentes. Já o historiador Eusébio só conseguiu contar 250.

À semelhança dos concílios realizados em Jerusalém sob a liderança dos santos apóstolos, o objetivo de Niceia era também conciliar agendas e ânimos. Infelizmente, teve de ser supervisionado por um imperador, cuja fé, até hoje, não foi devidamente explicada. Seja como for, os bispos saíram daquela reunião razoavelmente conciliados. Pelo menos levaram na bagagem um credo e uma cristologia bem definida.

Concílio! Gosto muito dessa palavra. Se lhe formos procurar o étimo, descobriremos: tanto o verbo conciliar quanto o substantivo concílio têm, em latim, uma procedência comum. Seja-me permitido, pois, dizer: o objetivo de um concílio não pode ser outro senão harmonizar, buscar acordos entre partes conflitantes e irmanar antagonismos. É claro que jamais devemos negociar a verdade bíblica nem apequenar a soberania de Cristo sobre a sua Igreja. Mas sempre que possível, busquemos a paz.

Algumas denominações ainda fazem uso desse termo. Outras preferem um mais adequado às suas demandas administrativas: convenção. Não vá pensar esteja eu sugerindo que se convoque uma assembléia para deliberar sobre a palavra mais apropriada. Concílio? Ou convenção? Afinal, ambas são tomadas, às vezes, como sinônimos. Atentemos, então, à etimologia do segundo vocábulo. Oriundo do substantivo latino coventionem, este termo significa não somente reunião, mas ainda ajuste, acordo. Por conseguinte, quando nos reunimos em convenção, objetivamos convencionar temas e pautas, buscando sempre a reconciliação. No entanto, ressalvamos: a supremacia das Escrituras Sagradas não pode ser negociada.

Afinal, convenção é igreja, ou não?

Para se formar uma sinagoga são necessários pelo menos dez varões judeus. Mas para se convocar a Igreja de Cristo, bastam duas ou três pessoas predisporem-se a se reunir em seu nome. É o próprio Senhor quem no-lo promete: “Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio deles” (Mt 18.20). Não importa se aí estão um homem, uma mulher e um menino. Ou três simples crianças. Se forem três pastores, melhor. Afinal, são três ministros do Senhor, que têm por hábito invocar constantemente o Cordeiro.

Suponhamos, então, estejam reunidos num mesmo lugar três mil pastores. Nesse caso, é o céu na terra. O monte transfigura-se e a roupa de todos resplandece. Pelo menos é o que deveria acontecer. Infelizmente, esquecendo-nos de que convenção também é igreja, ao invés de nos congregarmos em nome de Cristo, segregamo-nos partidariamente em torno de outros nomes. Este é de Paulo. Aquele, de Apolo. E aqueloutro, de Cefas. Oh, e há também os que declaram pertencer apenas a Cristo. Estes são os piores.

De repente, passamos a nos comportar como se estivéssemos numa agremiação política. Gritamos, ofendemos nossos pares, desrespeitamos os que presidem e acabamos por escandalizar a todos. Às vezes, até palavras de calão proferimos. Em algumas ocasiões, usamos a truculência e a força bruta.

Nessas ocasiões, esquecemo-nos de que há sempre um celular gravando-nos os excessos e uma filmadora nada discreta captando-nos cada um dos impropérios. No instante seguinte, está tudo na internet. Todo o nosso destempero vai para a rede. Como todos sabemos, caiu na rede é escândalo. Que espetáculo deprimente! Em minutos, fiéis e infiéis ajuntam-se para nos caçoar a insensatez. Até os nossos lábios são lidos, dando eco àquele palavrão que não conseguimos calar.

O que estamos legando às novas gerações? Uma coleção de postagens na internet, expondo-nos o mau testemunho e a postura nada exemplar? Sim, o que estamos deixando aos que nos sucederão nos púlpitos e nas cátedras? Nossos filhos e netos carecem de referências morais e espirituais. Se não lhas dermos, onde as buscarão? Nesse mundo que jaz no maligno?

Sim, convenção também é igreja. Logo, não pode ser uma mera democracia. Embora usemos o voto para escolher os que nos presidem, jamais será uma democracia: seu governo é cristocrático.

Conclui-se, pois, que Jesus é a cabeça não apenas da congregaçãozinha que se reúne ao pé do morro, como também da convenção que se instala no espaçoso e confortável auditório. Por isso, quer nos achemos num concílio, ou numa convenção, lembremo-nos de que estamos congregados em o nome de Jesus.

Sim, convenção também é igreja. E pastor também é crente.
 
Claudionor de Andrade é pastor,
Professor de Teologia Sistemática,
Gerente de Publicações da CPAD,
Membro da Casa de Letras Emílio Conde,
Membro Academia Evangélica de Letras,
Membro da Igreja Evangélica Assembleia de Deus

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